Teste do Pezinho: simples, gratuito e capaz de salvar vidas
Saiba por que o exame deve ser feito nos primeiros dias de vida do bebê e a importância da ampliação da triagem neonatal prevista em lei
Você sabia que um exame rápido, feito com poucas gotinhas de sangue colhidas do calcanhar do bebê, tem o poder de evitar mortes, prevenir sequelas graves e garantir melhor qualidade de vida? Estamos falando do teste do pezinho, nome popular para o exame de Triagem Neonatal, e obrigatório no Brasil.
E para lembrar a importância desse exame, o dia 6 de junho marca o Dia Nacional do Teste do Pezinho, data que reforça a conscientização da população e dá o tom da campanha Junho Lilás, com ações que se estendem durante todo o mês.
Segundo o médico pediatra e patologista clínico Armando Fonseca, coordenador de triagem neonatal e doenças metabólicas hereditárias dos Grupos Fleury e Santa Joana, a campanha também chama atenção para uma pendência importante: a regulamentação da Lei nº 14.154/2021. Aprovada há mais de três anos, essa lei prevê a ampliação do número de doenças testadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) em cinco etapas, passando de 6 para mais de 50 condições. Mas, na prática, o avanço tem sido lento: apenas alguns estados e municípios conseguiram ampliar o painel de triagem até agora.
“O Ministério da Saúde ainda não regulamentou a lei. Enquanto muitos estados seguem com o teste básico, alguns conseguiram verba e já estão ampliando seus painéis por conta própria, como o Distrito Federal, Minas Gerais e o município de São Paulo”, explica Fonseca, ex-presidente e atual presidente do conselho da Sociedade Brasileira de Triagem Neonatal e Erros Inatos do Metabolismo (SBTEIM).
O que o teste detecta
Atualmente, o teste do pezinho feito na rede pública inclui seis doenças, entre elas hipotireoidismo congênito, fenilcetonúria e doença falciforme. Já a versão ampliada, disponível em algumas regiões e nas redes particulares, pode detectar cerca de 50 condições, entre elas, doenças metabólicas, genéticas, imunológicas e raras, muitas vezes assintomáticas no nascimento. “A iniciativa privada já tem testes de 400 doenças”, aponta Fonseca.
O risco do diagnóstico tardio
Boa parte das doenças identificadas pelo exame são raras, mas potencialmente fatais se não tratadas a tempo, alerta o pediatra Antonio Condino-Neto, presidente do Departamento Científico de Imunologia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).
“A maioria tem evolução catastrófica. Sem diagnóstico precoce, a criança pode ter sequelas graves ou até morrer”, diz.
Ele cita como exemplo a imunodeficiência combinada grave (SCID, na sigla em inglês para severe combined immunodeficiency), também conhecida como “doença do menino da bolha”. “O bebê nasce com aparência normal, mas sem defesas no organismo. Se a condição não for identificada logo, ele pode contrair uma infecção e morrer. Por isso, a importância do teste do pezinho”, afirma.
Quando fazer o teste
O momento ideal para a coleta do teste é após 48 horas do nascimento, entre o 3º e o 5º dia de vida. “Esse período permite fazer o exame laboratorial, confirmar se existe alguma doença para, então, iniciar uma abordagem de terapia a fim de evitar sequelas e danos maiores”, esclarece Fonseca. “A vantagem do teste do pezinho é que você consegue descobrir doenças raras antes que elas causem um dano irreversível na criança. Por isso, a recomendação é colher o quanto antes”, declarou.
De acordo com o pediatra, o procedimento é simples e quase indolor: é feita uma pequena punção no calcanhar do bebê, que deve estar em posição de conforto no colo da mãe. “É uma região de pouca sensibilidade. O bebê ouve os batimentos da mãe e se acalma”, garante o especialista. Para bebês prematuros internados, o sangue pode ser coletado por outros meios, como o acesso venoso.
Outro mito recorrente é a confusão entre o teste laboratorial e o carimbo do pé no cartão. “Há pessoas que acham que o teste do pezinho é aquele de carimbar o pé da criança. Mas não é isso. O teste do pezinho é um exame sério, que envolve coleta de sangue, análise em laboratório e pode salvar vidas”, esclarece Condido-Neto.
O que poucos pais sabem é que, sem realizar o teste do pezinho, não é permitido registrar a criança no cartório, conforme determina a lei. Mas, mesmo sendo obrigatório, o alcance do exame ainda é desigual.
Fonseca recomenda que profissionais da saúde orientem as famílias sobre as possibilidades. “Mesmo que o laboratório público só realize seis testes, ele tem a obrigação de informar aos pais que existem outras versões mais completas. A mesma lógica vale para as vacinas: o SUS oferece ótimas opções, mas há vacinas que só estão disponíveis em clínicas particulares”.
Condido-Neto acrescenta que o médico também tem um papel de advocacy, isto é, de cobrar os políticos para que a lei seja, de fato, cumprida. “O prazo estipulado para ampliação do teste do pezinho no sistema público é 2026. É lei, é constituição.”
Por fim, ele lembra que, uma vez identificado o problema, o tratamento das doenças imunológicas está pactuado no SUS. “No caso da SCID, por exemplo, o tratamento é o transplante de medula. Para defeitos de anticorpos, é feita a reposição com imunoglobulina. Todos os recursos estão disponíveis na rede pública e também nos convênios”, conclui o imunologista.
6 de junho de 2025
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