Agosto Branco: quebrando o silêncio sobre o câncer de pulmão
No Brasil, o câncer de pulmão mata, em média, três pessoas por hora. Muitos desses casos poderiam ser evitados ou diagnosticados mais cedo
Agosto é o mês de conscientização sobre o câncer de pulmão, que, embora não seja o mais frequente, é o que mais mata. No mundo, ele responde por cerca de 2,5 milhões de casos e até 2 milhões de mortes por ano; no Brasil, são 32 mil novos casos e 29 mil óbitos anualmente.
O principal causador da doença é o tabaco, responsável por 70% a 80% dos diagnósticos. Provavelmente, você já sabia dessa informação. Mas até quem nunca fumou pode ser vítima dessa doença grave e, muitas vezes, fatal. “Entre 25% e 30% dos diagnósticos de câncer de pulmão acontecem em pessoas que nunca fumaram”, afirma o médico pneumologista Gustavo Faibischew Prado, que integra a Comissão de Câncer da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT) e também a da Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia (SPPT).
Isso acontece porque pessoas que jamais colocaram um cigarro na boca podem ser vítimas do tabagismo passivo, ou seja, não fumam, mas respiram a fumaça de cigarros, charutos, cachimbos ou dispositivos semelhantes usados por fumantes. Há outros fatores que aumentam o risco: poluição ambiental, presença de radônio no ar (um gás radioativo que emana do solo), histórico familiar de câncer de pulmão em parentes de primeiro grau e exposição a substâncias tóxicas no trabalho, como sílica, amianto, cromo, cádmio e níquel. “Algumas atividades relacionadas à pintura automotiva, à metalurgia e à siderurgia são as mais reconhecidas, mas a lista é bem grande”, disse o especialista.
O desafio dos cigarros eletrônicos (vapes)
O uso de vapes e cigarros eletrônicos é uma ameaça crescente, especialmente entre adolescentes e jovens. “A indústria do tabaco reposicionou o produto para atrair novos consumidores, com sabores e aromas que mascaram os riscos. Mas já sabemos que eles causam doenças respiratórias, cardiovasculares, metabólicas e possivelmente câncer de pulmão”, alerta Prado.
Durante o 16º Encontro do Fórum CCNTs, realizado em maio na capital paulista, a pneumologista Margareth Pretti Dalcolmo, então presidente da SBPT, fez um alerta contundente sobre o tema. Segundo ela, o consumo de cigarros eletrônicos cresce rapidamente no Brasil, principalmente entre as camadas médias da população, já que o custo ainda é alto para a população de menor renda. “Temos visto crianças e adolescentes adoecerem por causa dos vapes e tomografias de jovens de 19 anos que equivalem às de alguém com 80 anos que fumou a vida inteira. Infelizmente, haverá casos de enfisema pulmonar causando incapacidade respiratória em pessoas de 30 anos”, afirmou.
Sintomas que merecem atenção e motivam uma consulta médica
De acordo com Prado, nos estágios iniciais o câncer de pulmão pode não apresentar sintomas claros e, quando eles surgem, muitas vezes se confundem com problemas respiratórios já existentes — especialmente em fumantes. Ainda assim, é importante ficar atento a sinais como mudança no padrão da tosse, cansaço crescente, presença de sangue na secreção respiratória, dor no peito e perda de peso inexplicada.
O exame indicado para detectar precocemente a doença é a tomografia computadorizada com baixa dose de radiação, recomendada internacionalmente e no Brasil para pessoas com mais de 50 anos e histórico de tabagismo por pelo menos 20 anos.
No entanto, o rastreamento ainda não é um programa oficial do Sistema Único de Saúde (SUS); está em fase de planejamento e já vem sendo testado em projetos-piloto pelo país. Por isso, quem se enquadra nos critérios deve conversar com o médico sobre a possibilidade de realizar o exame.
Tratamento: não existe uma fórmula única
O tratamento do câncer de pulmão varia conforme o estágio da doença. Por isso, cada paciente passa por uma avaliação detalhada, que vai muito além de confirmar o diagnóstico. É preciso identificar o tipo e subtipo do tumor, verificar a presença de alterações genéticas e moleculares – informações que ajudam a prever o comportamento da doença e a resposta a tratamentos específicos, além de classificar o estágio de avanço, processo conhecido como estadiamento.
O estadiamento considera o tamanho do tumor, a presença de linfonodos comprometidos e a existência ou não de metástases em outros órgãos. Com base nesses dados, define-se a estratégia terapêutica: casos iniciais costumam ser tratados com cirurgia; doenças localmente avançadas, mas ainda restritas ao tórax, geralmente recebem combinação de quimioterapia, radioterapia e imunoterapia; e quadros mais avançados exigem tratamentos sistêmicos, que podem incluir quimioterapia, imunoterapia e terapias-alvo.
“Hoje, não existe um protocolo único para todos os pacientes, já que o câncer de pulmão é uma doença heterogênea e precisa ser caracterizado de forma precisa, com todas as informações necessárias para um plano terapêutico individualizado”, explica o pneumologista.
Prevenção: individual e coletiva
No nível individual, a recomendação é: não fume. Já no coletivo, as medidas envolvem controle do tabagismo, redução da poluição, eliminação de carcinógenos no ambiente de trabalho e melhoria das condições de ar em ambientes internos. Gustavo Prado destaca que mais de 3 bilhões de pessoas no mundo ainda se expõem diariamente à fumaça dentro de casa devido à queima de lenha, carvão e outros resíduos orgânicos para cozinhar ou aquecer o ambiente.
Além disso, ele afirma que é fundamental banir o uso de carcinógenos no ambiente industrial, como o amianto, desde a sua extração, passando pela mineração, processamento, fabricação de produtos e distribuição, até chegar ao uso final.
Em resumo, enquanto medidas individuais envolvem evitar o início do tabagismo e oferecer tratamento para quem quer parar de fumar, as ações coletivas exigem o controle de fatores que fogem ao alcance de cada pessoa e dependem da mobilização da sociedade para reduzir essas exposições em larga escala.
15 de agosto de 2025
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