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Menopausa: seria possível adiar essa fase (e suas turbulências)?

A busca por melhorar a qualidade de vida das mulheres traz até a promessa de uma injeção capaz de retardar o climatério

Em geral é por volta dos 45, 50 anos que as mulheres começam a viver um período de transição marcado por incômodos relacionados à redução de hormônios como estrogênio e progesterona. 

“Essas alterações desencadeiam inúmeras consequências, como irritabilidade, alteração do humor, insônia e, principalmente, os fogachos, as temidas ondas de calor, principal queixa e a que mais leva as mulheres a procurarem ajuda”, relata a endocrinologista Dolores Pardini, chefe do Ambulatório de Climatério e Menopausa da Disciplina de Endocrinologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). 

“Atrofia vaginal, que provoca dores na relação sexual, maior predisposição a infecção urinária e aumento de risco de perda de massa óssea e de doença cardiovascular também vão surgindo”, continua a médica. 

Os impactos físicos e emocionais do climatério, quando se inicia a queda hormonal, e da menopausa, termo que define a suspensão definitiva da menstruação, são a realidade de 29 milhões de mulheres no país, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 

“A menopausa precisa ser encarada com seriedade, sem preconceito, como um período pelo qual todas vão passar, umas com sintomas mais intensos do que outras, que merecem igual atenção das diferentes especialidades médicas. Não pode ser negligenciada”, diz a endocrinologista Karen de Marca Seidel, diretora da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM). 

Hoje, uma bem-vinda transformação na maneira de encarar essa fase natural da vida das mulheres ajuda a vencer tabus e a falar abertamente sobre o tema. Cada vez mais também se investe em estudos com foco em novas terapias e tecnologias voltadas a propiciar bem-estar a essa população, que só tende a crescer. “Com os avanços nos cuidados da saúde, vem aumentando a expectativa de vida, e boa parte das mulheres vai passar um terço de sua existência na menopausa”, lembra Pardini. 

Mas é possível que, no futuro, entrar ou não nesse período desafiador seja uma escolha? A pergunta ecoou em torno da divulgação de uma pesquisa para o desenvolvimento de uma injeção que impediria ou adiaria a chegada da menopausa e, portanto, de seus efeitos. 

Hormônio da reserva ovariana

“Os ovários são a chave para a longevidade feminina” – a frase da bióloga molecular Daisy Robinton, CEO da empresa americana Oviva Therapeutics, foi o fio condutor de sua apresentação em um congresso de longevidade realizado em dezembro de 2023, na Flórida, Estados Unidos. Guiados por essa premissa, pesquisadores da empresa investigam o desenvolvimento daquela que vem sendo chamada de injeção antimenopausa – produto sintético similar ao hormônio antimülleriano.

Antes de mais nada, é bom que se diga, os resultados discutidos no congresso são muito preliminares, baseados na experimentação da substância apenas em ratas. 

“O antimülleriano é um hormônio responsável por regular o recrutamento dos folículos ovarianos”, explica Karen. Todo mês, um deles é selecionado para ovulação. Se for fertilizado, vira um embrião e os demais folículos acabam morrendo. Se não ocorre a gestação, o óvulo é eliminado pela menstruação.

“As mulheres nascem com uma reserva desses folículos. A presença em grande quantidade do antimülleriano, no início da fase fértil, organiza esse recrutamento. Por volta dos 25 anos, começa uma queda do hormônio e, com o tempo, a diminuição acarreta a chamada atresia folicular, uma degeneração dos folículos, e a reserva ovariana vai se esgotando”, complementa. 

Na visão da especialista da SBEM, a injeção pesquisada pela Oviva teria maior probabilidade de influir, portanto, na fertilidade. “Talvez se imagine que a manutenção da reserva ovariana por mais tempo pudesse proporcionar a continuidade do estrogênio, que é produzido pelos folículos. Mas ele seria funcionante? Que dosagem seria necessária para ter algum efeito sobre os sintomas da menopausa? É tudo muito incipiente”, avalia.  

Desmistificar a menopausa

Alertando para a necessidade de tomar muito cuidado com promessas que remetam à juventude eterna, Karen Seidel ressalta que não se devem menosprezar as dificuldades enfrentadas com a chegada do climatério. “São muitos os sintomas, alguns antes mesmo que a mulher perceba a transição. Ela se sente mais cansada, muda a composição corporal, pode afetar a libido, o sono”, descreve. “Ela nota também alteração na memória, mais sensibilidade emocional, dificuldade de relacionamento no trabalho e em casa”, aponta. 

Mas existem recursos para mitigar essas manifestações, argumenta a médica. Hoje se pode controlar os fogachos, por exemplo, com medicação não hormonal. É possível tratar o ressecamento e a atrofia vaginal, inclusive com laser. Um estilo de vida mais saudável, com alimentação equilibrada e atividade física regular, constitui uma recomendação para manter o peso e a massa corporal em ordem. E o acompanhamento por psicólogos ou psiquiatras faz diferença nos distúrbios emocionais.

Para Dolores Pardini, a terapia de reposição hormonal é uma estratégia importante no manejo da menopausa. “Os benefícios superam os riscos. O receio é o de desenvolver tumor de mama, mas, para cada mulher que morre de câncer, 40 morrem de doença cardiovascular”, compara. Do ponto de vista da endocrinologista, muitas sofrem por desconhecimento, inclusive de profissionais de saúde, que demoram a fazer o encaminhamento para que recebam a terapia. Aí elas acabam perdendo a janela de oportunidade do tratamento, que só deve ser iniciado até no máximo dez anos após a parada da menstruação. 

“A individualização é soberana quando se vai administrar terapia hormonal”, defende Dolores. Com uma avaliação prévia do histórico familiar de câncer e do estado geral de saúde, assim como posteriores checagens regulares para saber como estão os sintomas, se é preciso ajustar dosagens de medicamentos e exames para verificar mama, útero e ovários, a reposição hormonal é indicação para evitar o prolongamento dos desconfortos do período. 

“É preciso desmistificar a menopausa, entender que se trata de um processo fisiológico natural, não ter vergonha, não ter medo de procurar tratamento”, reforça Karen de Marca Seidel. 

Por Goretti Tenorio,

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Goretti Tenorio

Jornalista pela ECA-USP, desde 2010 escreve sobre saúde para diferentes veículos.

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