Sociedade Europeia de Cardiologia incorpora saúde mental nas novas diretrizes de cuidado cardiovascular
Instituição defende que consultas psiquiátricas ou psicológicas incluam avaliação do risco cardiovascular
A medicina moderna já não permite separar o coração da mente. Em 2025, a Sociedade Europeia de Cardiologia (ESC) lançou um documento inédito mostrando que doenças cardiovasculares e transtornos mentais caminham de mãos dadas: cada uma pode aumentar o risco da outra, e, quando ambas estão presentes, os desfechos para o paciente são muito piores.
Nas palavras da ESC: “Queremos aumentar a conscientização sobre a relação multidirecional entre saúde mental e doença cardiovascular. Cada uma aumenta o risco da outra, e indivíduos com ambas têm piores resultados e a maior carga negativa de saúde”, explicou a professora Christi Deaton, uma das coordenadoras do documento.
O coração sofre quando a mente adoece. Depressão, ansiedade, estresse crônico e até o transtorno de estresse pós-traumático aumentam o risco de infarto, insuficiência cardíaca e arritmias. Por outro lado, receber o diagnóstico de uma doença cardíaca pode ser um gatilho para episódios de depressão ou crises de ansiedade.
Essa interação cria um círculo vicioso: o paciente deprimido tende a abandonar o tratamento, não seguir as recomendações médicas e ter menos energia para adotar hábitos saudáveis. Isso piora a saúde cardiovascular. Da mesma forma, quem convive com uma doença cardíaca pode desenvolver sentimentos de desesperança, medo da morte e isolamento social, que agravam transtornos psiquiátricos.
Por isso, a ESC defende que o atendimento cardiológico precisa olhar também para a saúde mental. E vice-versa: consultas psiquiátricas ou psicológicas devem incluir uma avaliação do risco cardiovascular.
A importância da triagem nos consultórios
A novidade do consenso da ESC é a recomendação de que a triagem de saúde mental passe a ser rotina nos consultórios de Cardiologia. Isso pode ser feito de forma simples, sem exames caros ou demorados, apenas com perguntas rápidas e validadas pela ciência.
Um exemplo é o Whooley Test, um questionário ultracurto para detectar sintomas de depressão. São apenas duas perguntas:
- “Durante o último mês, você tem se sentido frequentemente para baixo, deprimido ou sem esperança?”
- “Durante o último mês, você tem sentido pouco interesse ou prazer em fazer as coisas?”
Se o paciente responde “sim” a uma delas, já se recomenda investigação mais detalhada. Essa simplicidade permite que médicos de diferentes especialidades incorporem a triagem em consultas de rotina.
O impacto para pacientes e famílias
Segundo a ESC, “a prática clínica cardiovascular muitas vezes ignora o impacto da saúde mental e a importância de sua inclusão no cuidado. Precisamos ver profissionais de saúde cardiovascular desenvolvendo colaborações com profissionais de saúde mental em equipes ‘Psico-Cardio’ para ajudar a identificar precocemente condições de saúde mental em nossos pacientes”, destacou o professor Héctor Bueno, copresidente do grupo.
Além disso, o texto enfatiza que não apenas os pacientes, mas também seus cuidadores devem receber atenção psicológica. Quem cuida de um familiar com insuficiência cardíaca, por exemplo, está sob enorme sobrecarga emocional, que pode repercutir em sua própria saúde física e mental.
Um chamado à mudança
O documento da ESC fala em “mudança cultural”: a saúde cardiovascular não pode mais ser pensada apenas em termos de colesterol, pressão arterial ou cirurgia. É preciso incluir o bem-estar mental como um objetivo central.
Isso significa treinar médicos para reconhecer sinais de sofrimento psíquico, criar equipes multidisciplinares que incluam psicólogos e psiquiatras, e garantir apoio contínuo aos pacientes.
Como resume a ESC: “Recomendamos que os sintomas de saúde mental sejam sistematicamente rastreados durante o cuidado cardiovascular, e que o risco cardiovascular seja rotineiramente avaliado em pessoas em tratamento para condições de saúde mental” .
Para a população em geral, a mensagem é clara: cuidar da mente é cuidar do coração, e cuidar do coração é também cuidar da mente. Não se trata apenas de viver mais, mas de viver melhor, com qualidade de vida, autonomia e equilíbrio emocional.
Se você ou alguém próximo apresenta sinais de tristeza persistente, desânimo, ansiedade excessiva ou falta de prazer nas atividades, fale com seu médico. Da mesma forma, se recebeu diagnóstico de uma doença cardíaca, não negligencie sua saúde emocional.
1 de setembro de 2025
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