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Uso ético de testosterona em homens: diagnóstico correto e acompanhamento são cruciais

A reposição não pode ser banalizada, tampouco se deve negligenciar
a estratégia quando níveis baixos desse hormônio comprometem a qualidade de vida

Seja pela onda de apostar em soluções mágicas, seja pela frequente priorização de informações sensacionalistas sobre o uso abusivo, a indicação correta de testosterona para homens é um assunto pouco falado. As controvérsias em torno do tema preocupam especialistas como o endocrinologista Alexandre Hohl, professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), justamente pelo potencial de atrapalhar a busca por diagnóstico e atrasar o tratamento de quem de fato precisa fazer reposição adequadamente.

“Esse é um hormônio que faz parte do grupo dos esteroides sexuais, aqueles produzidos no ovário, a exemplo do estradiol nas mulheres, e nos testículos, caso da testosterona”, explica o médico. “Nos meninos, a partir da puberdade, ela é responsável pelo aparecimento dos caracteres sexuais secundários, ou seja, pelos no rosto e no corpo, crescimento do pênis e aumento de massa muscular”, descreve. “Mas do recém-nascido ao idoso, existem doenças que podem fazer com que o indivíduo não produza testosterona de maneira eficiente, condição chamada de hipogonadismo, que precisa ser investigada e tratada, sem se deixar levar por opiniões de quem não está habilitado para isso”, pondera.

Se um garoto vai passando pelos 13, 14, 15 anos e nada de aparecerem os caracteres sexuais secundários, é preciso checar a razão da puberdade tardia, entre elas alterações cromossômicas como a síndrome de Klinefelter, exemplifica o especialista.

Mas a maior parte dos casos de hipogonadismo é de homens adultos, que já têm vida sexual ativa, e algo faz com que a testosterona sofra uma baixa significativa, gerando sinais específicos como queda de libido, de desejo sexual, diminuição da qualidade da ereção e piora da performance sexual”, lista Alexandre Hohl. Podem surgir ainda sintomas não tão característicos e, por isso mesmo, capazes de ser confundidos com outras doenças: cansaço, fraqueza, alteração do sono e do humor. “O quadro muitas vezes leva a pensar em problemas na esfera emocional, em depressão, tanto que recebo muitos pacientes encaminhados pela psiquiatria”, observa o médico. 

A investigação do hipogonadismo é mesmo complexa, com muitas variáveis a serem consideradas. “Não dá para achar que fadiga por si só seja sinal de testosterona baixa. Tem que desconfiar se esse sintoma estiver associado à disfunção erétil, por exemplo”, diz Hohl, que é também editor do livro Testosterona: dos aspectos básicos aos clínicos, lançado mundialmente.

Tem que medir o hormônio regularmente?

De acordo com Hohl, a dosagem de testosterona não é um exame de rotina e só deve ser solicitada para homens com sinais e sintomas suspeitos ou que tenham alguma condição clínica que justifique o pedido, como tumor na hipófise, a glândula localizada no cérebro e que controla os hormônios. Ou, ainda, para aqueles que fazem uso crônico de medicamentos com potencial para afetar a produção de testosterona, a exemplo de corticoides e opioides. 

A infertilidade também é indício de desordem hormonal. “Se o testículo é responsável pelo espermatozoide e a testosterona, a falha na produção de um provavelmente significa que o outro igualmente não está nos níveis adequados”, analisa Hohl. Nesse caso, vale a pena pedir o teste.

Para a dosagem do hormônio, a coleta deve ser feita de manhã cedo, com o homem em jejum. E, mesmo quando surgem alterações, para confirmar o diagnóstico de hipogonadismo, o exame precisa ser repetido.

A testosterona cai com a idade?

Diferentemente da mulher, que tem a parada de produção dos ovários quando chega a menopausa, no homem a diminuição de testosterona fica em torno de 1% ao ano depois dos 50 anos de idade. “É possível chegar aos 70, 80 anos com status normal do hormônio”, explica Hohl. Mas o estilo de vida faz diferença nesse contexto, ressalta o professor da UFSC. Isso porque boa parte dos homens com problemas associados ao déficit de testosterona integra o grupo daqueles com obesidade, diabetes e pressão alta – ou seja, a presença de doenças crônicas é fator importante a considerar na avaliação das flutuações hormonais.

“A premissa é que sono de qualidade, controle de estresse, alimentação saudável, peso adequado, exercício físico regular e cessação do fumo são relevantes na produção de testosterona”, avisa.

Como é feita a reposição hormonal?

Uma das opções disponíveis no Brasil, aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), são medicações injetáveis de curta ação, administradas de forma intramuscular, em intervalos de duas a quatro semanas. Já as injeções de ação prolongada duram três meses, com a vantagem, portanto, de serem apenas quatro aplicações por ano. “As de curta ação são mais antigas e apresentam mais flutuação hormonal, ao passo que a trimestral é mais linear nesse sentido”, esclarece Hohl.

Uma alternativa é o gel transdérmico, para uso diário. “O benefício dessa forma é que, se aparecer algum efeito colateral, como permanece apenas 24 horas, basta suspender o uso. A desvantagem, por outro lado, é o risco de transferência. Como o gel é aplicado geralmente nos ombros, é preciso atenção para não ser tocado por outra pessoa inadvertidamente”, completa.

E as contraindicações?

A reposição de testosterona pode atrapalhar a fertilidade, então não é indicada para quem tem a perspectiva de ser pai. “Nesse caso, tem a possibilidade de usar medicação que estimule o testículo a trabalhar melhor”, diz Hohl. “A contraindicação absoluta de reposição de testosterona acontece em casos de câncer de próstata em atividade, assim como de câncer de mama, que, embora seja mais raro, atinge homens também”, adverte.

De acordo com Hohl, é preciso levar em conta ainda as chamadas contraindicações relativas, aquelas relacionadas a condições que precisam ser tratadas e controladas antes de se pensar em iniciar reposição – entre elas, insuficiência cardíaca descompensada e apneia do sono. 

A segurança cardiovascular do uso de testosterona, aliás, foi foco de um estudo publicado no New England Journal of Medicine em 2023. “O trabalho reuniu centenas de centros de pesquisa que ofertaram testosterona para homens de meia-idade e idosos com hipogonadismo e que tinham alto risco cardiovascular. E se constatou que não houve elevação desse risco ao repor o hormônio de maneira fisiológica”, afirma Hohl. 

O expert lembra, porém, que o princípio não vale para o uso indiscriminado de testosterona, sem a devida avaliação de níveis hormonais e sem acompanhamento especializado. “Para quem não tem necessidade e fica usando altas doses com fins estéticos, para aumento de performance, é outra história. Aí surgem problemas como acne, queda de cabelo, alterações articulares, de fígado, de coração”, alerta. 

O importante mesmo é lembrar que, quando a queda de testosterona é comprovada, dá para mitigar o problema e suas consequências. Existe tratamento e, com o devido acompanhamento, é possível prescrever a reposição hormonal e ajustar formas de administração e doses quando necessário, sempre com o propósito de garantir o bem-estar de homens em qualquer fase da vida.

Por Goretti Tenorio,

Olhar da Saúde-Goretti Tenorio

Goretti Tenorio

Jornalista pela ECA-USP, desde 2010 escreve sobre saúde para diferentes veículos.

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